terça-feira, 23 de outubro de 2007

ENTREVISTA GAZETA DO FUTEBOL

1ª Parte

JAIME PACHECO






“GOSTO DO BOAVISTA E TODAS AS VEZES QUE O CLUBE ESTEVE MAL VIM A CORRER”



Pacheco pede compreensão e união aos adeptos do Boavista e acredita que só assim é possível ultrapassar a crise em que o clube se encontra mergulhado.



PATRÍCIA MARTINS



Jaime Pacheco é um homem de valores bem vincados e dono de uma personalidade forte. Humilde e sincero, gosta de olhar as pessoas nos olhos. De características rústicas, não se inibe com as perguntas e expressa-se de forma curiosa, sempre gesticulando muito. Tem um orgulho imenso na sua mulher e nos seus dois filhos e considera-os a sua força.
No Bessa, local de encontro para a entrevista, não transparece a imagem de crise no balneário de que às vezes se fala. Os jogadores saem e cumprimentam o mister com boa disposição e sorrisos à mistura.



GAZETA DO FUTEBOL: Como se vê? Considera-se uma pessoa paciente?

JAIME PACHECO: Eu sou muito suspeito para falar de mim, mas considero-me uma pessoa de extremos. Sou muito paciente, mas quando perco a paciência faço coisas totalmente opostas. Passar do 8 ao 80 invoca muitas coisas. Naquele português mais popular, sou capaz de “ficar cego” e aí extravaso todas as minhas emoções, as minhas situações de desagrado e desconforto. Mas é difícil que isso aconteça, pois de uma forma geral contenho-me. Penso que com a idade e a própria maturidade que uma pessoa vai adquirindo leva-nos muitas vezes a ver as coisas de forma diferente.



"EU FAÇO O QUE QUERO E BEM ME APETECE"



G.F.: Tem um lema de vida?

J.P.: Tenho acima de tudo uma coisa, que é fundamental para um cidadão que gosta de ser feliz: Eu faço o que quero e bem me apetece.
Naturalmente que tenho os meus deveres e as minhas obrigações. Tenho os meus compromissos sociais, desportivos, humanos e familiares. Mas de uma forma geral faço o que quero. Até na actividade que exerço, embora gostasse mais de ser jogador de futebol do que treinador. Apesar da idade ainda tenho o bichinho e a paixão de jogar futebol. Mas consegui ter o privilégio de fazer o que gosto. Na vida lá fora, sem me desfazer dos comportamentos que devo ter a todos os níveis, faço o que gosto, não me agarro a tabus, a compromissos, a obrigações ou a coisas que considero sem grande importância para a minha forma de estar. Tenho uma vida relativamente pacífica e tranquila, a ponto de me relacionar com tudo e todos, mas sempre do meu agrado, isto é, respeito muito a vida, o espaço, a forma de ser e de estar de cada um. Mas tenho uma maneira muito própria de estar, uma personalidade muito vincada em relação àquilo que são os meus princípios, àquilo que acho que é bom para mim, para os meus e para quem eu gosto.


G.F.: Então preocupa-se em primeiro lugar consigo?

J.P.: Não sou egoísta! Mas fundamentalmente não faço nada que me desagrade. Não chego a ter uma vida monótona nem muito repetitiva, mas o facto é que há valores que de alguma forma vivem um pouco comigo, como conviver com os amigos. E dou muita importância à questão familiar pois tenho uma família que está acima daquilo que idealizei. Acho que até nisso fui muito contemplado pela sorte. Penso que a felicidade vive comigo por causa disso. Tenho dois filhos e uma mulher que acima de tudo são a minha forma de estar e viver na sociedade. Por eles sou capaz de ir mais além do que de uma forma normal seria.


G.F.: São a sua força?

J.P.: Também são. Eu acho que há determinados momentos em que as coisas não são devidamente satisfatórias ou vão contra aquilo que são desejos. Eu procuro neles aquela força que às vezes é importante para eu superar e ultrapassar esses momentos. É natural que isso aconteça com toda a gente. Mas penso que nem todos têm a mesma felicidade que eu tenho com a família.


G.F.: Disse que continua ligado ao futebol e que gosta mais de jogar do que treinar. É verdade que nos tempos livres costuma jogar Futsal?

J.P.: No dia-a-dia, se puder fazer alguma coisa em termos de trabalho prático que me ajude a melhorar o grupo, e quando vejo que a minha intervenção vai ser benéfica, faço-o sempre, porque gosto.
Mas depois disso, quase todos os dias tenho solicitações para jogar com os amigos em torneios. Contudo, já jogo menos torneios do que jogava. Não é por questões de não poder ou não gostar, mas chego à conclusão que para evitar situações desagradáveis prefiro abdicar dos torneios e confraternizar com os amigos. Não quer dizer que não jogue um torneio ou outro…
Jogo muito futsal. Porquê? Com a idade que tenho, quase 50 anos, o futsal faz com que não tenha que despender de tanto esforço físico e faz com que o contacto com a bola seja mais frequente. E também devido ao grupo de amigos, pois é um futebol mais tipicamente da minha idade. No entanto, sinto condições e jogo muitas vezes em campo normal, isto é, futebol de 11.


G.F.: Tem alguma superstição?

J.P.: Às vezes tento agarrar-me a algumas coisas. Mas por questões de feitio e personalidade, não dependo disso. Mudo, altero e faço de uma forma natural. Não me agarro a nada, não tenho nenhuma superstição que diga que dependo disso.



"TER SIDO CAMPEÃO NO BOAVISTA É UMA COISA HISTÓRICA E INIGUALÁVEL"



G.F.: O que mais orgulho lhe deu conseguir?


J.P.: As vitórias, sejam quais forem, sabem sempre bem e são de facto um fiel amigo, um aliado muito importante para o nosso estado de espírito no dia a dia. Mas naturalmente que os títulos que consegui ganhar como jogador e treinador são marcos históricos e inesquecíveis, que com o decorrer do tempo vão ganhando outra importância. Mas para ter conseguido tudo isso foi preciso uma estabilidade e solidez com outros departamentos e outras pessoas que me ajudaram, pois faço parte de um desporto colectivo. Eles próprios são tentáculos desta minha estrutura desportiva e vivida. Entendo que são pessoas muito importantes que me ajudaram a valorizar a todos os níveis essas coisas e por isso jamais os esquecerei.


G.F.: São todos os títulos importantes de igual modo ou há algum que lhe tenha dado mais gosto conquistar?

J.P.: Eu não sei. Acho que não era justo por acima este ou aquele título, esta ou aquela vitória, este ou aquele troféu. Eu vivo as coisas de uma forma muito sentida. Penso que o último foi sempre mais importante… Se calhar por estar mais próximo! Mas de uma forma geral já me emocionei com todos eles e lembro-me de todos eles. No entanto, na nossa profissão o cargo que exerço é de facto muito difícil. Ter sido campeão no Boavista é uma coisa histórica e inigualável, isso concerteza que tem mais peso e é mais valioso pois isto não se consegue tão facilmente, não é repetitivo. É aquele que mais vivi e mais sinto de uma forma positiva.


G.F.: Há alguma coisa de que se arrependa?

J.P.: Não. Para mim a pior coisa na vida e na sociedade é sentir ou viver com situações desagradáveis, nomeadamente a guerra. Sou uma pessoa que me emociono muito quando vejo crianças a passar fome e países constantemente em guerra. O facto das pessoas serem ingratas e viverem sempre a quererem que aconteça mal aos outros desagrada-me profundamente.
No entanto, muito honestamente em termos profissionais o que mais me desagrada é perder. De facto, dou-me mal com a derrota, é um inimigo com o qual não me consigo relacionar. No que diz respeito ao resto, acima de tudo procuro dar-me bem com toda a gente e tento que a minha intervenção seja sempre de uma forma construtiva, empreendedora, e com intenção de ajudar o próximo. Temos que viver numa sociedade em que muitas vezes as dificuldades são maiores e é preciso ter uma acção de ajuda e colaboração, participar mais e de forma positiva. Não sou daquelas pessoas negativas, antes pelo contrário, faço as coisas pelo lado positivo.




AMANHÃ: SEGUNDA PARTE DESTA ENTREVISTA


"TENHO JOSÉ MARIA PEDROTO COMO TREINADOR DE REFERÊNCIA"


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