domingo, 6 de janeiro de 2008

REPORTAGEM GAZETA DO FUTEBOL

A PAIXÃO DE UM «PANTERA NEGRA»







Ricardo Pinho é um dos elementos mais reconhecidos da claque «Panteras Negras», mas pelos lados do Bessa todos o conhecem por “Gaia”. “Porquê Gaia? Porque há uns anos só eu era de Gaia e andava com a faixa para todo o lado, então foi ficando Gaia e eu até gosto. Se aqui me chamassem Ricardo seria muito estranho.”



PATRÍCIA MARTINS



Tem 27 anos e desde os sete que é sócio do Boavista. A paixão pelo clube está enraizada desde sempre – na família todos são boavisteiros – até a filha de apenas três meses já é sócia do clube. Há mais de uma década que pertence aos «Panteras Negras». Cresceu no meio da claque e isso reflecte-se no à vontade com que está entre os Ultras. No dia-a-dia mostra-se uma pessoa muito calma, tímida até, mas em dias de jogos extravasa as suas emoções. “Com a paragem de campeonato, devido ao Ano Novo, já estava a sentir a falta de alguma coisa.”

A poucos minutos do início do jogo entre o Boavista e o Sporting, Gaia entrou na bancada do topo sul do estádio do Bessa. Na mão trazia o megafone e no coração o nervoso miudinho de mais um jogo. Ainda antes das equipas entrarem em campo era tempo de erguer a bandeira. Como se diz na gíria popular, Gaia é “pau para toda a obra”: não se acanha em esvoaçar as bandeiras, tocar o bombo ou mesmo dar o mote para o apoio à equipa axadrezada com o megafone em punho.

Com o início da partida, os «Panteras Negras» fazem-se ouvir no estádio. Gaia está quase sempre voltado de costas para o jogo, a incentivar os restantes elementos no apoio ao Boavista. Não se importa com isso, mas há alturas em que fica desanimado: “ O que mais me custa é quando não estou a ver o jogo e depois ninguém canta, está tudo sentado e calado”.

Para quem está entre os Ultras fica claro que Gaia é, na maioria das vezes, o responsável pelas vozes soarem nas bancadas: “Não deixa morrer, não pára! Mais alto! Vamos lá!”. No entanto, com um sorriso tímido, nega ser um líder no topo sul: “sou apenas mais um elemento”. O nome Gaia é conhecido por praticamente todos os adeptos do Bessa e até por outros estádios do país. Se por um lado isso o deixa contente, por outro lado traz algumas desvantagens: “sempre que há alguma confusão acham que é o Gaia e a maior parte das vezes eu nem sei o que se passou. Aconteceu isso quando pintaram frases contra o Pacheco e me ligaram a pensar que tinha sido eu. Estava em casa e nem sabia que o tinham feito”.

Quando confrontado com a hipótese de vir a ser um dia presidente da associação «Panteras Negras», é convicto na resposta: “Não. Se já assim me ligam a coisas que nunca fiz, que fará se fosse!”

A seis minutos do intervalo surge o tão desejado golo do Boavista: explosão de alegria na bancada e Gaia não é excepção. Salta do lugar e o sorriso estampa-se na cara. Com a vantagem, há que continuar a dar força à equipa. É claro que as vozes de apoio sobem de tom sempre que há uma oportunidade de golo mais clara, tal como um canto. Gaia compreende, mas é a favor do apoio durante os 90 minutos e não só nos momentos fulcrais de uma partida.

O intervalo chega e é altura de descompressão. Há tempo para falar um pouco dos sacrifícios que às vezes são necessários para estar sempre presente: “quando os jogos são fora, e no dia seguinte vou trabalhar, praticamente faço directas, uma vez que tenho de me levantar muito cedo.” A família há muito que se habituou à sua vida enquanto Ultra: “A minha mulher sabe que o Boavista é a minha felicidade e não se opõe, apenas receia por eventuais confusões”.

Como membro da claque «Panteras Negras», tem muitas histórias para contar, mas afirma que “actualmente há muito menos violência nos estádios”.

No retomar da segunda parte, ele volta a puxar pelos adeptos. Entoam-se cânticos, batem-se palmas e vive-se a rivalidade Porto – Lisboa: “Pessoal, está tudo com as mãos em cima! E quem bate palmas é tripeiro!”. Apesar de estar com o megafone, Gaia ainda arranja tempo para dar uns toques no bombo.

O receio de um eventual golo do adversário deixa a claque mais ansiosa, mas aos 79 minutos o Boavista marca o segundo golo. Nova explosão, desta vez ainda mais emotiva. Era uma vitória praticamente assegurada e logo frente a um dos “grandes”.

Até os jogadores saírem de campo cantava-se e festejavam-se mais 3 pontos alcançados.

Gaia é exemplo de três coisas: humildade, entrega e paixão pelo Boavista. Um maestro de costas para o espectáculo, um líder de frente para a vida…

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